A obesidade é o terceiro ônus social mais caro no mundo, atrás apenas do fumo e da violência provocada pelas guerras e pelo terrorismo. Essa é a afirmação do diretor-geral da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO), o brasileiro José Graziano da Silva. Ele revela também um dado alarmante: a obesidade custa à economia global mais de US$ 2 trilhões a cada ano, quase 3% do PIB global. Ou seja, é uma grande ameaça para a saúde pública e privada no Brasil e no mundo.
Outro dado relevante é o da Organização Pan-Americana de Saúde, apontando que o sobrepeso afeta 54% da população brasileira. Quase 20% dos homens e 24% das mulheres estão obesas. Entre as crianças menores de cinco anos, 7,3% registram sobrepeso no país.
O contraste desse levantamento relacionado ao custo da obesidade é que, segundo a FAO, há 815 milhões de pessoas morrendo de fome no mundo, ou seja, não sabem se terão o que comer no dia de amanhã ou encerram o dia com nada ou quase nada para comer. No Brasil, o número de pessoas com fome reduziu, e muito, graças a alguns programas sociais. Não obstante, a desnutrição começa a dar sinais preocupantes novamente, em razão da crise social, política e econômica do país.
Um estudo recente do Ministério da Saúde revelou que, entre 2006 e 2016, a taxa de obesidade cresceu 20%. Hoje, um a cada cinco brasileiros pode ser considerado obeso, e mais da metade está com sobrepeso, segundo levantamento do governo federal. Tal fato afeta diretamente as saúdes pública e privada, que sentem o reflexo diário de milhões de pessoas que possuem enfermidades e doenças graves oriundas da obesidade. Não há uma política de prevenção. Na verdade, são poucas e isoladas as ações e programas que incentivam, principalmente na saúde privada, a alimentação saudável e o controle da obesidade.
Divulga-se constantemente na mídia que a obesidade aumenta a incidência de doenças cardiovasculares, cerebrovasculares e respiratórias, osteoarticulares, entre outras. Existem em algumas cidades, entre elas o Rio de Janeiro, iniciativas interessantes como Estatuto da Pessoa Obesa, com diretrizes para auxiliar no controle e combater o avanço da obesidade, mas com foco na discriminação do obeso. O Congresso Nacional também analisa um projeto de lei federal (PL nº 4328/2016), para estabelecer uma política nacional. Entretanto, no Brasil, infelizmente, há uma cultura de se criar leis inócuas, principalmente quando não há um bom gerenciamento de seus objetivos. A lei não é desnecessária, mas tem que vir acompanhada de ações efetivas.
O obeso mórbido pode ser enquadrado como deficiente, desde que seja avaliado por equipe multiprofissional e interdisciplinar – pessoa com deficiência é aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Para se ter uma ideia da falta de política pública, há casos de pessoas obesas que tiveram o atendimento negado em hospitais e postos de saúde por falta de estrutura mínima e equipamentos apropriados para recebê-los – exemplos são os consultórios dentários que não têm cadeiras adequadas para esse perfil de público, ou hospitais cujos equipamentos possuem limite de peso imposto pelo fabricante. Logicamente, a negativa de atendimento causa um constrangimento e também uma barreira para essas pessoas.
Se for necessário buscar o procedimento cirúrgico pelo SUS para tratar o obeso mórbido (como a cirurgia bariátrica, por exemplo), a espera poderá ser entre cinco a sete anos para ser operado. Muitas vezes, o paciente morre antes de conseguir ser atendido.
Quando o assunto é obesidade, prevenção e controle são fundamentais, o que implicaria a economia de elevados recursos financeiros destinados ao tratamento da própria doença. Necessário atuar em prol de ações efetivas de prevenção da obesidade. Incentivar a alimentação saudável, as atividades físicas e o tratamento de saúde.
A ação é conjunta, sociedade e governo, para que se mudem as crescentes estatísticas. Há uma geração obesa que continuará a onerar os cofres da saúde pública e privada. É preciso encontrar uma saída para essa epidemia do século XXI, dando ao problema o tamanho que ele tem.
*Sandra Franco é consultora jurídica especializada em direito médico e da saúde, doutoranda em Saúde Pública, presidente da Comissão de Direito Médico e da Saúde da OAB de São José dos Campos (SP) e membro do Comitê de Ética para pesquisa em seres humanos da UNESP (SJC) e presidente da Academia Brasileira de Direito Médico e da Saúde