A Abrafarma, em parceria com a Universidade Federal do Paraná, realizou entre junho e agosto de 2018 uma pesquisa nacional sobre serviços farmacêuticos. Ao todo, 4.897 farmacêuticos atuantes em redes associadas de farmácias de todo país responderam a um inquérito online, relatando sua opinião sobre o tema e detalhes de sua prática em farmácias e drogarias. Isso corresponde a aproximadamente 23% dos 21 mil profissionais que atuam nas redes da Abrafarma.
O perfil dos farmacêuticos participantes foi o seguinte:
A média de jornada de trabalho relatada pelos farmacêuticos é de 36,5 horas semanais, sendo que 47,3% fazem jornada de 44 horas/semana. Durante uma semana típica, 17 horas, em média, são passadas atendendo clientes no balcão, dispensando medicamentos. Atividades administrativas, incluindo SNGPC, respondem por 7,4 horas semanais de trabalho. Gerentes e não-gerentes reportam tempos semelhantes dedicados à dispensação e às atividades administrativas.
Do total de respondentes, 41,9% (2.052) trabalham em farmácias que dispõem de sala de serviços farmacêuticos. Esse número dobrou, em relação a estudo semelhante feito em 2013. Naquele ano, apenas 20,2% dos entrevistados da pesquisa anterior dispunham dessa estrutura.
Esses farmacêuticos relatam passar, em média, 5,7 horas por semana atendendo pacientes em sala privativa, sendo que 25% relatam 7 horas ou mais por semana. O tempo dispensando medicamentos no balcão é de 17,5 horas/semana, semelhante ao grupo total de farmacêuticos. Farmacêuticos que ocupam cargo de gerência passam menos tempo em atendimento privativo de pacientes (3,2 horas/semana em média contra 6,3 horas/semana para não-gerentes).
Os farmacêuticos foram questionados sobre a oferta de 24 serviços de farmácia diferentes (tabela 1). Os serviços mais comumente oferecidos são medida da pressão arterial (84,7% dos farmacêuticos), teste de glicemia capilar (73,6%), campanhas de saúde envolvendo a comunidade (62,9%), programas de acompanhamento para hipertensão, diabetes e dislipidemias (60,5%, 59,5% e 47,9%), programas de cessação tabágica (57,9%), gestão do peso (56,1%), revisão da medicação (55,5%) e aplicação de injetáveis (52,8%). A média é de 8,9 serviços diferentes oferecidos por farmacêutico. Testes rápidos de colesterol são realizados por 17% dos farmacêuticos, testes para doenças infecciosas (p.x. HIV, dengue, hepatite C) por 8% e serviço de vacinação por 6,9%. Em 2013, a média de serviços oferecidos era de apenas 1 por farmacêutico, principalmente aplicação de injetáveis (51%), medida da pressão arterial (33%) ou teste de glicemia (10%). 95,4% dos respondentes mantém registros dos atendimentos feitos e 62,4% utilizam software para esse registro.
Tabela 1. Serviços de farmácia mapeados pelo estudo
No comparativo entre as regiões do país, profissionais do Norte, Nordeste, Centro-oeste e Sul oferecem entorno de 10 serviços e passam de 8 a 9 horas por semana atendendo pacientes de forma privativa. O Sudeste aparece como região com oferta menor de serviços (7,4 por farmacêutico) e menos tempo dedicado aos atendimentos (6,1 horas por semana).
Os farmacêuticos responderam também a um questionário validado com 18 perguntas, que avalia a atitude, motivação e intenção de comportamento relativos aos serviços farmacêuticos. Para diferentes afirmações do questionário, os farmacêuticos escolheram respostas que vão de “discordo fortemente” a “concordo fortemente”, gerando uma pontuação de 1 a 5. Este questionário já foi aplicado anteriormente, em estudo conduzido pela Abrafarma em 2013, o que permite comparar resultados.
A maioria dos profissionais revelou uma atitude bastante positiva em relação aos serviços em farmácias. Diante de afirmações como “A participação dos farmacêuticos na provisão de serviços clínico-assistenciais em farmácias e drogarias é um passo importante para o avanço da profissão como um todo”, “A prestação de serviços farmacêuticos pode ser lucrativa para minha farmácia/drogaria” e “Meu envolvimento na prestação de serviços farmacêuticos aumentaria minha satisfação com meu trabalho”, os farmacêuticos assinalaram que concordam ou concordam fortemente em 96,1%, 89,1% e 83,5%, respectivamente.
Em relação aos fatores externos que podem influenciar a prestação de serviços, 87,1% concordam que os clientes gostariam que a farmácia prestasse serviços e 68,5% acreditam que seus superiores diretos dão apoio a essa iniciativa. Em relação aos médicos, 50% acreditam que os mesmos aprovariam essa prestação de serviços na farmácia (15,3% discordam dessa afirmação). 57% dos farmacêuticos acredita que a farmácia deve oferecer serviços para se manter competitiva no mercado.
A maioria dos farmacêuticos, no entanto, não acredita que depende só deles a oferta desses serviços (69,1% discordam dessa afirmação) e 35,9% acreditam não dispor de uma equipe adequada para isso. Por outro lado, 61,3% pretendem oferecer serviços em sua farmácia e 43% planejam falar com seu superior sobre o assunto.
O gráfico abaixo mostra a pontuação média em cada domínio do questionário (atitude, norma subjetiva, controle percebido e intenção de comportamento) em uma escala de 1 a 5. Observa-se que os farmacêuticos que atuam em farmácias com salas de serviços farmacêuticos apresentam pontuações superiores em todos os domínios analisados, em comparação aqueles que atuam em farmácias sem oferta de serviços.
Gráfico 1. Pontuação no escore de comportamento planejado. Total de respondentes: 4.897 farmacêuticos, sendo 2.052 atuantes em farmácias que oferecem serviços farmacêuticos.
Esse instrumento permite também o cálculo de uma pontuação em escala de 100, chamada Escore do Comportamento Planejado (ECP). Escores acima de 75 pontos significam melhor perfil comportamental para a prestação de serviços farmacêuticos. A pontuação média obtida foi de 71,9 pontos, levemente superior à pontuação observada na pesquisa de 2013, que foi de 69,5 pontos, mas o percentual de farmacêuticos com escore >75 pontos foi de 41,4%, bastante superior aos 29% com essa pontuação observados em 2013.
Considerando apenas os farmacêuticos que atuam em farmácias que dispõem de sala de atendimento e oferta de serviços (2.052 pessoas), o escore médio obtido foi de 75,6 pontos e 57,8% tem escore acima de 75 pontos, em comparação a apenas 29,6% dos respondentes que atuam em farmácias sem oferta de serviços. Os farmacêuticos que atuam em farmácias com essa estrutura mostraram, portanto, um perfil comportamental bastante mais positivo em relação aos serviços, em comparação aqueles não dispõem dessa estrutura.
Além disso, farmacêuticos com um escore acima de 75 pontos oferecem maior número de serviços (10,5, em média), em comparação aqueles com 75 pontos ou menos (6,7, em média), conforme pode ser visto no gráfico a seguir.
A estrutura disponível e a oferta de serviços nas redes de farmácias mudaram sensivelmente nos últimos cinco anos. Apesar de barreiras regulatórias ainda dificultarem a expansão de alguns serviços, como testes rápidos e vacinação, a tendência é de crescimento dessa oferta para os próximos anos. A atitude, a motivação e o comportamento planejado dos profissionais vem mudando, com cada vez mais farmacêuticos aderindo a esta nova prática profissional.
Os profissionais concordam que a oferta de serviços farmacêuticos nas farmácias não depende exclusivamente de sua vontade, mas deve estar inserida em um contexto organizacional, em que os líderes e empresários enxergam os serviços como parte de seu negócio principal. Por outro lado, profissionais com um perfil mais orientado a serviços conseguem fazer a diferença, ofertando maior número de serviços, passando mais tempo com pacientes e tendo uma atitude mais proativa.
Os resultados deste estudo mostram que a farmácia continua sua transformação, de ambiente transacional de venda de medicamentos, para um estabelecimento que oferece produtos e serviços voltados à saúde, beleza e bem-estar.
Sobre o autor: Cassyano Correr é farmacêutico, doutor em medicina interna e coordenador do Programa Assistência Farmacêutica Avançada da Abrafarma. Contato: [email protected]
“As opiniões aqui expressas são de responsabilidade do autor e não representam, necessariamente, posicionamento oficial da Associação Brasileira das Redes de Farmácias e Drogarias – Abrafarma”.